Insuficiências

Pode um homem catador de ruídos construir belezas de ouvir? Se pudesse, o feito não seria belo, quebraria, derreteria, já que o ruído não possui a consistência que as coisas que são de fato coisas possuem, e nem seria belo, porque o belo é uma coisa e não um nome. O ruído é o nome de uma não-coisa. Porém, por artifício pobre dos feitos do homem, poderia até a construção de ruídos ser bela, mas a beleza não funcionaria, pois a beleza que é a própria e não o nome, além de coisa é também movimento - ela se move como uma mosca, escapando da mão dos homens enquanto os rodeia, prevendo a insuficiência de seus gestos. Já a beleza de um ruído é artificial porque mais nome que coisa, e sendo imóvel, pode ser apanhada pelas mãos de homens lerdos, como todos são. O ruído, além de nome de não coisa, e além de imóvel, é assustadoramente eterno. Parece sair dos muros cinzentos da metrópole, justamente esses infestados de nomes que são só nomes, (sem coisas nem gente) O ruído se propaga e infesta tudo que é vivo, talvez pra matá-los. A beleza é absurdamente mortal, inofensiva, fraca, rápida, mas idiota, e vive bem menos que uma mosca macho, dessas que amaldiçoam os homens por quase 28 dias. E é por esses motivos que não pode um catador de ruídos construir belezas de ouvir, e é por isso, que os poetas são bobocas, Ícaros alucinados pelo terror sonoro do mundo. O Sol dos poetas arde os alfabetos, incinera a métrica e as figuras de linguagem, carboniza os nomes – Sem isso, todos eles somem.
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6dd510c93a992592 Postado Originalmente em: /posts/internal/37335

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