Não me considero feminista ...

Não me considero feminista ... porque não quero ser colocada no mesmo saco das pessoas que saem na “Marcha das vadias”, ou que introduzem estátuas de santos católicos em seus orifícios, ou que usam sangue menstrual como batom pra protestar... Feministas são todas umas desocupadas que não tem algo concreto pelo que lutar. Ah essa história de Manspreading... não acham que o mundo não tem problemas mais sérios para serem debatidos? Ah vão achar um terreno pra capinar!  

Eu sempre tive as mesmas chances que qualquer outra pessoa, então por que ao invés de feminismo não utilizamos a palavra equidade ou igualdade? Me considero uma mulher que teve as mesmas chances de estudar que meus três irmãos homens. Também me considero uma pessoa que tem as mesmas chances e salários que meus colegas de trabalho e, por isso, não precisamos ter este tipo de discussão... bom... talvez poderíamos falar sobre as mulheres muçulmanas, pois elas sim vivem em uma sociedade extremamente machista.  Mas nós?

Bom, gostaria de saber se alguém compartilha destas ideias e dizer-lhe que até pouco atrás eu também falava tudo isso que citei acima. Mas uma coisa é certa, gente: precisamos falar de Feminismo sim. Infelizmente. Quem dera não precisássemos mais.  

O fato é que muitas vezes algo tem que acontecer com você, para você entender o que os outros passam. Eu fui a sortuda do dia. Hoje um cara que estava sentado ao meu lado no ônibus teve a cara de pau de pôr suas mãos nas minhas coxas. Não tentou puxar assunto comigo, não tentou olhar nos meus olhos, não me deu um sorriso, ele simplesmente foi enfiando a mão entre minhas pernas. 

 Eu sempre pensei que se um dia isso acontecesse comigo, eu iria chamar a polícia ou iria fazer um escândalo e toda a gente do ônibus iria me apoiar. Bem, não foi o que aconteceu. Quando desci da condução e cheguei no meu destino, quase apática ... começaram a aparecer inúmeras ideias de vingança na minha mente: por que eu não derramei a sopa que tinha guardada em um potinho na cabeça dele? Por que eu não cuspi na cara dele? Por que eu não dei um soco nas partes íntimas dele?! Agora passou. Não sei quem é, nem pra onde ia e tudo vai ficar por isso mesmo. Será que ele ficou constrangido com o empurrão e os gritos que dei? Quem sabe não... quem sabe eu só tinha sido mais uma. As pessoas do ônibus? Bem, provavelmente pensaram: o que que esta turista quer? Por que você não vai pra praia e nos deixar voltar sossegados pra nossas casas depois de um dia de trabalho? Enfim, mais uma histérica louca. Que bom que ela desceu do ônibus. 

Eu costumava pensar, se há alguém que talvez poderia falar em feminismo seriam todas as mulheres que usam burca, que não podem estudar e que não podem dirigir. Eu? Eu tenho tudo, vivo numa sociedade democrática, laica, igualitária, ou seja, sou uma privilegiada. Papo de feminista é papo de universitariazinha ou européia que não tem muito contato com o mundo de verdade, eu dizia. Bem, a questão é que eu já viajei muito e nunca tinha passado por tamanha situação! Hum... tirando aquele patrão que sempre me dava cantada ou aquele colega de que tentou me beijar à força, ah e aquela outra vez que... deixa pra lá. A questão é que ainda não tinham tocado as minhas coxas e isso foi o que mais me doeu. 



Sabe porque temos que falar em feminismo? Porque igualdade é uma coisa diferente. Enquanto alguns homens acharem que têm direito de tocar nas coxas de uma mulher que está sentada ao seu lado no ônibus, que têm o direito de insistir em ter relações sexuais com sua esposa ou namorada mesmo que ela não queira, que têm o direito de se relacionar com meninas de 12 anos (elas querendo ou não), ou tocar em menininhas de 5 anos. Sim! Teremos que falar em feminismo. Enquanto houver homens mais velhos casando com meninas de 15 anos como acontece no interior do país, enquanto houverem meninas induzidas/proibidas a não estudar porque precisam cuidar da casa, ou enquanto houverem homens escolhendo as roupas que suas mulheres vão vestir... não teremos que falar apenas em igualdade, mas também em feminismo. Em respeito. Em ter a liberdade de pegar um ônibus sem ser tocada.     


25 de novembro de 2017, Isla de San Andrés.



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